Pablo de Carvalho

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Recife, Pernambuco, Brazil
Escritor (romancista), compositor, cronista e delegado de polícia. Vencedor do prêmio Alagoas em cena 2006, com o romance Iulana, publicado, no mesmo ano, pela Universidade Federal de Alagoas. Vencedor regional e nacional do programa Bolsa Funarte de Criação Literária 2011, da Fundação Nacional de Artes, do Ministério da Cultura, com o romance policial Catracas Púrpuras, lançado no Rio de Janeiro, em novembro de 2012. Escreveu, também, a novela O Eunuco (Edições Catavento, 2001), e o romance O Canteiro de Quimeras (Writers, 2000). Compôs, em parceria com Chico Elpídio, o disco Contemporâneos.

sexta-feira, 16 de março de 2012

O Politicamente Incorreto (Estilo: cotidiano)



Diz como é que um homem faz pra relaxar! Um homem apegado à vida e ao movimento dos acontecimentos; um homem que se importa… Ele não relaxa. Vai à rede, abre o livro, pega o café, acende o cigarro, mas tudo lhe baratina a cuca, tudo lhe mete pela cabeça dentro os lamentos, as ponderações e, no rastro, a perspectiva iminente da morte. É a cidade íntima que traz em si, onde se movimentam a mulher, o trabalho, a moral e a imoralidade; as ideias de amanhã ser melhor – de amor e amizade. Seria aparentemente simples: deixa essa merda se danar e aproveita o tempo! Mas, ah, não é bem assim: o cérebro, automático, faz do autômato alguém que já só pertence às ondas de fatos rebatidas nos olhos, no coração, pelas veias todas e na pele, como a pintar sua carne de notícias e opiniões.

Digam o que quiserem do politicamente incorreto, mas existe uma raça de homens que só encontra redenção na bebida. Não falo dos alcoólatras agudos, porque se consomem numa guerra que eu não conheço; falo daqueles que, feito eu, precisam visitar o sublime de quando em vez, esse céu abstrato que se reconhece na bebida; que lhe abre o amor detrás da cortina do cotidiano. E a casa disso é a sexta-feira, com sua sagrada acumulação de labuta e o sublime acontecimento de seu entardecer. E o nome disso é pileque – porre é muito agressivo; embriaguês, muito técnico; pileque é doce; o demais é gíria e mau gosto, nem vale a pena citar.

Sabe bem quem o sente: chegar às sextas, sentar num canto, ouvir música e tomar uma bebida! Tudo lhe amolece, depois comove, e os acordes vêm em tom de abraço curtir a alma daquele que, embora esteja sempre sonhando, é agora o próprio sonho em movimento ascendente.

E se lhe disserem (dedo na cara), nesse momento, que ele está iludido, que vai assim bambo por conta de uma química que lhe cala uma fraqueza da infância remota num tabu fálico em forma de garrafa etc. e blá-blá-blá, ele rirá, operário encantado em seu ritual de ternura e bendizer, e afagará os cabelos dos críticos, e será doce seu olhar respondendo: relaxa…


Um comentário:

  1. Palavras, versos inebriantes. Parabéns pelo belo trabalho caro amigo. Abraço.

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